Libertação do euro<br>é condição de progresso
SEMINÁRIO A submissão ao euro priva Portugal de soberania e impede-o de se desenvolver, concluiu-se num seminário promovido pelo PCP em cooperação com o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica do Parlamento Europeu.
O PCP teve e tem razão em opor-se à moeda única
A participação de cerca de uma centena de pessoas na iniciativa realizada na tarde de sexta-feira, 24, no Seminário de Vilar, na cidade do Porto, sob o título «O Euro e a união económica e monetária – Defender o desenvolvimento económico e social e a soberania», atesta a pertinência do tema que o Partido considera há anos ser central na abordagem das causas que levaram Portugal e o povo português à situação em que se encontram, e, consequentemente, às soluções para dela sair.
O PCP iniciou este mês uma campanha nacional, que se prolonga até Junho, sob o lema «Produção, Emprego, Soberania – libertar Portugal da submissão ao Euro». Isto mesmo referiu João Ferreira, deputado do PCP no PE, o primeiro dos nove oradores a ser chamado por Ângelo Alves, da Comissão Política do PCP, que dirigiu a sessão.
Na sua intervenção, João Ferreira procedeu ao enquadramento da iniciativa e recordou dois factos que corroboram a actualidade da discussão: as recentes declarações do presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, e a ameaça de sanções a Portugal por parte do Banco Central Europeu, ambas de recorte neocolonial apesar das diferenças de tom, alertou.
O deputado do Partido no PE reiterou igualmente que «problemas estruturais» colocados pela «trama» que a União Económica e Monetária (UEM) «foi tecendo», tais como a institucionalização da austeridade, a promoção da exploração, da concentração e centralização de capitais; o agravamento da recessão, da especulação financeira e da submissão dos estados a esta por carência de um banco emissor e prestamista de última instância; o desinvestimento e desindustrialização na periferia; a crise social, a degradação das funções sociais do Estado e o crescimento insuportável das dívidas pública e privada, exigem «respostas estruturais, e não a maquilhagem financeira e monetária».
Dito de outro modo, «para grandes males, grandes remédios», e porque a vida está a provar que «a adesão ao euro foi um desastre e a permanência é um desastre»; porque é cada vez mais evidente que quem diz que «o problema não é do euro, mas da política do euro» não percebe «que o genoma do euro é o da austeridade e do empobrecimento» e que o euro «não pode servir a dois amos ao mesmo tempo [Alemanha e Portugal, o centro e a periferia]» - João Ferreira enunciou «linhas de ruptura» que permitem remover o «cutelo sobre a cabeça dos povos» que constituem o euro e a UEM.
Crise da e na UE
A necessidade de recuperar a soberania e a capacidade para trilhar caminhos de progresso económico e social não está apenas colocada a Portugal. Disso mesmo deram conta Neoklis Sylikiotis, membro do comité central e deputado do Akel de Chipre no PE, e Per Bergholdt Jensen, membro do Movimento Povos contra a UE. O primeiro, dando como exemplo a situação económica e social de Chipre e lembrando as propostas da Comissão Europeia, defendeu que à crise do capitalismo agravada pelas políticas neoliberais não se pode responder com a mesma receita em favor daqueles que apelidou de «elite económica».
Per Bergholdt Jensen, do Movimento Povos Contra a UE, partilhou da urgência de derrotar os constrangimentos impostos pelo euro porque pese embora a Dinamarca não pertença à UEM, os governos e partidos do «consenso europeu» atrelaram o país a alguns dos seus instrumentos, desencadeando a perda de soberania e uma ofensiva contra os direitos e rendimentos dos trabalhadores dinamarqueses.
Entre uma e outra intervenção, o economista, professor e investigador alemão Heiner Flassbeck mostrou que a moeda única só é vantajosa para o grande capital germânico e que foi e é justamente esse o seu propósito. Apresentando um vasto conjunto de dados económicos comparativos, Flassbeck argumentou que uma das questões centrais na luta pelo direito ao desenvolvimento e contra a política do euro, é a impossibilidade de países como Portugal ajustarem a produtividade aos salários nos mesmos moldes que a Alemanha, questionando a política imposta por Berlim, a causa, na sua opinião, do endividamento dos estados do sul da Europa.
Já depois das intervenções dos convidados estrangeiros, João Rodrigues, professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e investigador do CES, relatou que a introdução do euro em Portugal assinala a passagem de um período de convergência (apesar de todas as desigualdades, assimetrias e devastação provocadas pela integração na UE), para um período de divergência. A situação seria socialmente ainda mais explosiva caso não houvesse a válvula de escape da emigração, disse João Rodrigues, para quem a «estratégia da fraude» que representa o euro e os seus instrumentos só já se consegue impor «pela chantagem e pelo medo», e para quem as propostas do PCP de saída do euro e desmantelamento da UEM, associadas à renegociação da dívida e ao controlo de capitais e do sistema bancário, são viáveis e imprescindíveis.
Existe alternativa
Os deputados do PCP no PE, Miguel Viegas e João Pimenta Lopes, à sua vez, trataram de desmistificar a euro-propaganda. Miguel Viegas pegando no relato sucinto de uma visita recente aos Estaleiros Navais do Mondego, salientou que a UE pega «na crise e nos seus sintomas» e justifica-os «com o carácter incompleto de pilares fundamentais da integração europeia». O fito é avançar com uma alegada tecnocratização orçamental e com a União Bancária, contrárias aos interesses dos povos e reveladoras do carácter de classe de uma UE que o PCP há muito considera irreformável, frisou. João Pimenta Lopes, na mesma senda, alertou que o «pilar social» no quadro do jargão «mais Europa», «assume-se como um dos cantos de sereia com que se tenta avançar no aprofundamento da UEM». Previsivelmente, vai saldar-se num «instrumento de nivelamento por baixo dos direitos laborais e sociais», advertiu.
Durante o período de debate, que se seguiu, o euro e os seus instrumentos foram amplamente criticados e houve mesmo lugar ao esgrimir de argumentos e divergências. Pontuais, porém, pois o que ficou de substantivo do conjunto das intervenções proferidas da mesa e da assistência, é que o PCP teve e tem razão. Não apenas na necessidade de libertar o País da moeda única e dos seus instrumentos, consolidados ou futuros, mas de aliar a esse processo a renegociação de uma dívida pública que coloca o Estado «a pagar anualmente mais de oito mil milhões de euros em juros», a título de «uma dívida que é impagável» e que subtrai recursos essenciais para o investimento, dinamização da economia e combate à pobreza e às injustiças, como disse quase a fechar a iniciativa Ilda Figueiredo, economista e membro do Comité Central do PCP.
O PCP teve e tem razão em opor-se à moeda única e exigir a saída desta e o desmantelamento da UEM, «negociando medidas compensatórias para os países que possam ter mais dificuldades no processo», porque «a adesão ao euro – tal como a estrutura da UE, desenvolvida ao serviço dos interesses do grande capital monopolista – representou um violento salto qualitativo» que «submete o País à chantagem dos chamados mercados, da UE, do BCE, da troika», impedindo a concretização da política alternativa, patriótica e de esquerda, de que o povo e o País carecem, sintetizou Jaime Toga, da Comissão Política do PCP a encerrar o seminário-debate.